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A revolução é feminina: documentário aborda assédio nas cidades brasileiras

Quarta-feira, 06 de Junho de 2018

Caroline da Silva

Da inconformação com comportamentos e atitudes violentas - consideradas normais - contra as mulheres surgiu a vontade de filmar Chega de Fiu Fiu, documentário das diretoras Amanda Kamanchek Lemos e Fernanda Frazão.

O título saiu da campanha homônima criada pela organização Think Olga, trazendo ao centro do debate questões como o assédio e o direito das mulheres ao espaço público, fundada por Juliana de Faria - que também é entrevistada na produção. "Com o movimento feminista e uma série de campanhas como essa surgiram em 2014, o tema se tornou parte da agenda pública e ganhou força. Nós queríamos retratar esse momento de mudança de perspectiva, mostrar como o assédio acontece; mas, principalmente, como as mulheres resistem e criam estratégias para lidar com esta relação desigual de poder entre homens e mulheres", explica Amanda, que é jornalista e trabalha em projetos sociais.

A obra parte do questionamento se as cidades foram feitas para as mulheres. Os três cases principais do documentário são retratados nas regiões metropolitanas de Brasília, Salvador e São Paulo. A jovem artista visual Rosa Luz, mulher trans e negra, é do Gama, próximo à capital federal. Ela percebeu que o seu corpo foi objetificado após a transição de gênero e não se sente segura em nenhum transporte público.

Também negra, a baiana Raquel Gomes de Souza - estuprada ainda menina pelo tio, na casa da avó, durante uma festa religiosa - trabalha como manicure e é estudante de Enfermagem. Ela perdeu peso para ir para a faculdade, pois não passava nas roletas de ônibus e era constrangida pelos motoristas. No entanto, afirma não precisar seguir um padrão estético, diz que se sente bem. Mas sente medo ao andar na rua sozinha e conta que só não foi assediada na praia, quando todos os corpos estão à mostra. Hoje, tem um casamento por amor com uma mulher.

A terceira personagem é a professora de História Teresa Chaves, ruiva de 33 anos, que vive em São Paulo e se locomove pedalando. Para ela, a fragilidade da mulher na bicicleta é maior do que quando está a pé. Na sua opinião, tradicionalmente, pela educação recebida, o espaço público é domínio masculino, e o privado, feminino.

Amanda conta que a ideia inicial era de que a maioria das personagens fosse negra, considerando a grande intersecção entre gênero e raça quando se trata da violência para com as mulheres. Elas conheceram Rosa por meio do canal dela no YouTube, o Barraco da Rosa TV. "A expectativa de vida das mulheres transexuais no Brasil é de 35 anos. E a violência contra mulheres negras só piorou nos últimos anos, o que torna evidente o quanto as políticas públicas não chegam para essas mulheres, em especial as negras, trans e pobres", ressalta. "Rosa é uma artista impressionante, que, por meio de vídeos, performances e poesia, resiste, incomoda e transgride relações de poder estabelecidas."

Também são ouvidas pelas diretoras especialistas em identidades, sexualidade, mobilização social e masculinidades: a filósofa Djamila Ribeiro, a historiadora Margareth Rago e Nilcea Freire - ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres. Ainda há uma roda de conversa entre homens discutindo os problemas e uma possível solução para o assédio. "Justamente para confrontá-los e refletir sobre como eles aprendem desde muito cedo a tratar mulheres como objeto, a expressar seus desejos sem levar em consideração que relações precisam de consenso, do interesse e da disponibilidade delas. Muitas vezes, quando eles assediam uma mulher na rua, o fazem para mostrar para os amigos que 'são homens', e sequer consideram o que ela tem a dizer", explica Amanda. Para a diretora, com o filme, os homens também podem entender que há uma série de violências que somente mulheres sofrem.

Conforme a realizadora, uma das grandes conquistas foi na questão do assédio, que hoje é muito mais debatida: "No entanto, na prática, as mulheres ainda o sofrem nas ruas. Uma mulher é estuprada cada 11 minutos, e o Brasil segue em 5º lugar no ranking mundial de feminicídio". Amanda traz dados para afirmar que a cultura segue machista, racista, sexista e transfóbica. "As mulheres têm enfrentado esse tema, mas os homens não deixaram de assediar e ainda precisam rever, de fato, seus comportamentos e atitudes", avalia.

Amanda destaca que Chega de Fiu Fiu está disponível na internet para quem quiser organizar uma sessão pública em sua cidade, acrescentando que adoraria vir à Capital para debater em escolas ou universidades, e com legisladoras e gestoras.

Fonte: Jornal do Comércio



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